Dom Casmurro, clássico de Machado de Assis, será transformado em musical
Um dos maiores clássicos literários brasileiros – senão, o maior – está prestes a se tornar música e ação em um nova produção independente da A Casa Que Fala em parceria com a Tomate Produções, dirigida pelo premiado Zé Henrique de Paula, com letras, músicas e direção musical de Guilherme Gila e direção de movimento de Zuba Janaína. Baseado no livro de 1899, “Dom Casmurro” levará para o palco do Teatro Estúdio, em São Paulo, a partir de 04 de novembro, a escrita do carioca Machado de Assis, sob o som de diferentes ritmos, indo do rock à MPB.
O projeto, pensado a partir da percepção de um “gap” no mercado de musicais brasileiros, é de Guilherme Gila, autor de obras ousadas como o “A Igreja do Diabo – um musical imoral e hilário”, também baseado em uma obra de Machado – e vencedor dos Prêmios Bibi Ferreira na categoria Melhor Musical Off e Destaque Imprensa Digital na categoria Destaque Dramaturgia Original -, e Davi Novaes, que planejaram durante três anos a adaptação da obra mais conhecida do autor para o universo do teatro musical, com músicas especialmente compostas para ele.
“Tanto eu quanto o Davi temos um apreço gigante por literatura, sobretudo a literatura do nosso país. Eu percebi que lá fora muitos dos musicais que amamos e são sucessos gigantes na Broadway, partem da adaptação da literatura americana e literatura mundial, mas no Brasil os musicais nacionais em sua maioria partem das biografias. Decidi então focar em adaptar nossos livros e autores para o teatro musical, e rapidamente apareceu Dom Casmurro”, conta Gila sobre o processo do projeto.
Como surgiu a ideia de fazer Bentinho, Capitu e Escobar cantarem?
O projeto surgiu em 2021 durante a pandemia, com uma outra produção que não seguiu com a proposta, e de lá para o cá, tudo foi reformulado para se encaixar numa perspectiva original e intimista. Gila convidou Davi Novaes para o escrever o texto do musical, e com a união das produtoras A Casa Que Fala e Tomate Produções, “Dom Casmurro” começou a sair do papel.
“Nossos encontros ocorriam toda segunda-feira à noite para compartilhar o que havia sido escrito e alinhar as ideias. Às vezes, um texto se transformava em música e uma letra de música virava texto, assim costurando o espetáculo. Com a chegada de Zé, novas ideias surgiram, proporcionando uma nova visão sobre o texto”, conta Gila.
A escolha pelo tarimbado diretor, que hoje coordena a Direção Artística do Núcleo Experimental – instituição reconhecida por trazer um olhar inovador para o teatro – veio pela admiração pelo trabalho do grupo de artistas e pelo fato de Gila já ter tido a oportunidade de trabalhar com Zé Henrique e Fernanda Maia, premiada dramaturga do Núcleo.
“A importância que o Zé (Henrique de Paula) dá para o trabalho dos atores e para a construção de uma encenação orgânica e sensível são coisas que me atraem muito. Em 2022, quando todo o texto e as músicas estavam prontas, juntei alguns amigos queridos e fizemos uma leitura fechada de “Dom Casmurro” para o Zé e a Fernanda (Maia) numa tarde. Ele ficou muito tocado pelo projeto e, a partir daí, já era nosso diretor.”
Desafios da adaptação de um clássico literário
Adaptar a escrita machadiana e sua originalidade para o palco não é uma tarefa fácil. Há um misto no desafio de manter a originalidade da obra e também apresentar um novo olhar – que justifique a transposição para o palco. No processo criativo do musical, Davi Novaes faz algumas escolhas para chegar em um lugar único e original que desejam para obra:
“Tentei me ater ao livro o máximo possível, fonte de todas as outras adaptações que, querendo ou não, figuram na minha memória. A minissérie dirigida por Luiz Fernando Carvalho, ‘’Capitu’’, me acompanhou enquanto imaginário, pois me marcou muito, mas não escrevi nenhuma cena diretamente influenciada por ela ou por qualquer outra adaptação que tenha encontrado pelo caminho. Tentei criar a minha própria, a partir das palavras do Bruxo do Cosme Velho“, explica o ator e dramaturgo.
Os autores também se apoiam em alguns recursos literários – deixas dadas pelo próprio Machado para construir a narrativa da peça – que parte do princípio de que é Bentinho, o narrador do texto é uma fonte não confiável dos fatos – o que gera ambiguidade no seu discurso e permite que algumas escolhas artísticas sejam tomadas no palco.
“Nessa adaptação, tomei a liberdade de evidenciar algo que já vem sendo discutido há décadas sobre nosso protagonista Dom Casmurro: sua inconfiabilidade. Na nossa versão, isso é assumido: Dom Casmurro prepara os atores de sua própria história para entrarem em cena, dá falas para que Capitu saiba o que dizer na história que ele conta sobre os dois. Esse é o fio principal que guia essa nossa visão do clássico machadiano. E, por fim, Guilherme Gila faz justiça e concede à Capitu a palavra final”, antecipa Davi.
Escolhas musicais
Longe de ser uma obra “datada” ou “de época”, a proposta da abordagem de Novaes e Gila traz escolhas bastante irreverentes no que diz respeito a escolha das músicas que levarão a cabo a trama do casal mais famoso da literatura brasileira. Por exemplo, para a fase em que Bentinho se rebela contra a decisão da mãe de ser padre – fruto de uma promessa da matriarca – o rock and roll foi o ritmo escolhido para imprimir todos esses elementos de rebelião típicos da juventude.
A MPB foi outra grande fonte de inspiração para criar o cancioneiro original da espetáculo. Partindo de um viés emocional provocado pelas decisões estilísticas de Machado de Assis, Gila chegou à música brasileira para manter conectado o espetáculo com a nossa cultura. “As melodias surgiram como uma forma de engrandecer e reproduzir estas emoções que Machado de Assis evoca a cada parágrafo. Eu busquei usar referências da MPB tanto na forma de escrever as letras quanto em algumas melodias para envelopar esses estilos e manter a identidade brasileira da obra,” explica o autor do espetáculo.
FICHA TÉCNICA:
Texto: Davi Novaes (baseado na obra de Machado de Assis) | Letras, músicas e direção musical: Guilherme Gila | Direção geral: Zé Henrique de Paula | Direção de movimento: Zuba Janaína | Assistência de direção: Mafê Alcântara | Desenho de luz: Fran Barros | Desenho de som: Cauê Palumbo | Figurino: Ùga agÚ | Assistência de figurino: Cauã Stevaux, Gagum Silvestre, Mariana Garcia, Natália Munck e Rafael Océa | Visagismo: Zé Henrique de Paula | Perucaria: Laerte Késsimos | Cenografia: Zé Henrique de Paula | Cenotécnico: Cauê Maia | Elenco: Luci Salutes, Rodrigo Mercadante, Cleomácio Inácio, Larissa Carneiro, Fábio Enriquez, Nábia Villela e Eduardo Leão | Piano e regência: Guilherme Gila | Violino: Samir Alves | Violoncelo: Felipe Parisi | Percussão: Daniel Alfaro | Transcrições: Samir Alves | Editoração: Felipe Parisi | Arranjos: Samir Alves e Guilherme Gila (com colaborações de Felipe Parisi e Daniel Alfaro) | Músicos substitutos: Bruna Barone (percussão), Giovanni Sartori (violoncelo) e Paulo Viel (violino) | Técnico de luz: Claudio Gutierres | Operação de som: Tatah Cerquinho | Técnico de som: Thiago Schin | Produção geral: A Casa que Fala e Tomate Produções | Coordenação de produção: Marcos Mattje e Rebeca Reis | Produção executiva: Titto Gonçalves e Rebeca Reis | Assistência de produção executiva: Gregory Pena | Assistência de produção: Anne Beatriz, Babi Trabasso, Gabriel Arjona, Giulia Lavinia, Victor Edwards e Vitor Colli | Identidade visual: Dan Maschio | Layout do programa: Isa++ | Editoração do programa: Anne Beatriz | Assessoria de imprensa: GPress Comunicação (Grazy Pisacane) | Fotografia: Felipe Quintini, Pedro Veras e Hallan Fidelis
SERVIÇO:
Local: Teatro Estúdio
Rua Conselheiro Nébias, 891 – Campos Elíseos – São Paulo/SP
Temporada: de 4 a 27 de novembro
Sessões: segundas às 20h | terças às 20h | quartas às 20h (exceto 6/11)
Duração: aproximadamente 120 minutos (incluindo 15min de intervalo)
Classificação: Livre
Ingressos: R$120 (inteira) e R$60 (meia-entrada)
Venda online: Sympla
(haverá bilheteria física no teatro 2h antes do início da sessão)
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Sobre Davi Novaes
Davi Novaes é Bacharel em Letras pela USP e mestrando em Estudos Literários pela UNIFESP. Dramaturgo e professor de escrita criativa, é ator formado por instituições como Teatro Escola Macunaíma e Casa de Artes Operária. Integrou o elenco de peças como “Sweeney Todd” e “Chaves”, ambas com direção de Zé Henrique de Paula, além de “Bonnie & Clyde”, “Um Bonde Chamado Desejo” (peça vencedora de 3 Prêmios Shell) e “Príncipe Desencantado”, pelo qual foi indicado ao Prêmio FEMSA como Melhor Ator. Como autor, escreveu e atuou nas peças “O Que Restou de Você em Mim” e “É Sempre mais Difícil Ancorar um Navio no Espaço”. Em 2024 estreou na direção com as montagens “Lembranças Boas Demais Para Esquecer, Por Ruins Demais Para Serem Lembradas”, de Gabriel Cersosimo e “Ainda Tenho o Mesmo Telefone”, de Beatriz Nascimento.
Atualmente trabalha no SBT e prepara seu terceiro texto autoral “Onde Fica Essa Ilha a Que Só Chegamos por Naufrágio”, além de integrar o elenco da montagem de “Shakespeare Apaixonado”, com direção de Rafael Gomes.
Sobre Guilherme Gila
Guilherme Gila é ator, dramaturgo, compositor, e diretor musical. Escreveu texto, letras e músicas, e dirigiu o espetáculo “A Igreja do Diabo – um musical imoral e hilário”, vencedor do Prêmio Bibi Ferreira como Melhor Musical Off de 2023, além de receber “Destaque Dramaturgia Original” do Prêmio Destaque Imprensa Digital. É formado em Música pelo Conservatório Musical André da Silva Gomes, pós-graduado em Música e Imagem e também pós-graduado em Canção Popular Brasileira, ambas pela Faculdade Santa Marcelina. Atualmente integra o elenco de “Clara Nunes – a tal guerreira”. Recentemente integrou o elenco de “Sweeney Todd” e foi pianista-regente e assistente de direção musical do espetáculo “Codinome Daniel”, no Teatro do Núcleo Experimental (2024). Também realizou a direção musical dos espetáculos “Para Não Gritar”(2024), “Bosque dos Sonâmbulos”(2023), “Operação Rematrícula” (21 Chump Street, 2018), “Cruella – um novo musical” (2018 e 2022). Trabalhou como Assistente de Direção Musical nos espetáculos do Núcleo Experimental: “Cabaret dos Bichos” (2022), e “Brenda Lee e o Palácio das Princesas” (2022), e fez a direção musical de 5 leituras cantadas da Incubadora de Musicais do Núcleo Experimental (2023).
Sobre Zé Henrique de Paula
Zé Henrique de Paula é diretor teatral, ator, dramaturgo, cenógrafo e figurinista, além de diretor artístico do Núcleo Experimental. Vencedor dos prêmios Shell, APCA, Reverência, Bibi Ferreira, Arte Qualidade Brasil, Aplauso Brasil e Destaque Imprensa Digital, dirigiu recentemente os espetáculos “Codinome Daniel”, “Once”, “Um panorama visto da ponte”, “Dogville”, “1984”, “Natasha, Pierre e o Grande Cometa de 1812”, “Pacto, a história de Leopold e Loeb”, “Lembro todo dia de você”, “Urinal, o musical”, “Chaves, um tributo musical”, “Sweeney Todd” e “Brenda Lee e o Palácio das Princesas”, entre outros. Bacharel em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Mackenzie, com pós-graduação em Artes Cênicas pela Escola de Comunicação e Artes da USP, recebeu o título de Mestre em Direção Teatral pela University of Essex e cursou Figurino na University of the Arts, ambas em Londres. Também estudou interpretação e direção teatral na GITIS – Universidade Russa de Artes Teatrais.